ensaio - Adeus “Complexo de Édipo”

 Adeus “Complexo de Édipo”

Freud é o cara, sem sombra de dúvidas! A humanidade pôde dar grandes passos (poderia dar bem mais), com as teorias freudianas. Entretanto, algumas teorias dele podem ser questionadas/criticadas, afinal, não é uma religião dogmática, pelo contrário, o pai da psicanálise se dedicou, arduamente, a construção de uma teoria científica, logo, passível de crítica.

Buscar desvelar/conhecer a estrutura psíquica do ser humano é/foi um pequeno passo para humanidade mas, um gigantesco salto para o homem (trocadilho com a frase proferida por Armstrong, ao pisar na Lua), enquanto subjetividade. Evidente que o homem – subjetividade – estando organizado psiquicamente, contribuirá inevitavelmente, para uma sociedade inclusiva e cooperativa. Infelizmente, insiste-se no oposto, ou seja, quer-se forçar uma sociedade solidária, democrática... mas as pessoas, em geral, seguem crianças desamparadas, carentes, iludidas e cheias de desejos egoístas, de forma que é certo que a humanidade seguirá caminhando “com passos de formiga e sem vontade” cooperativa.

E Freud foi a pessoa responsável por essa “revolução copernicana”, ou melhor, assim como Copérnico compreendeu e explicou que era a Terra girava em torno do Sol – e não o inverso – de forma comparável, Freud compreendeu e explicou que o Ser Humano gira em torno de um inconsciente, inerente a cada um e não em torno de algo externo. Claro que tudo que é externo ao sujeito, sempre o influenciará, mas, é a organização psíquica interna/pessoal/subjetiva que será o determinante na vida de cada um, inclusive será a partir desta (des) organização que cada um/uma retribuirá a vida em sociedade.

Falando em “determinantes”… apresentarei a minha crítica ao famoso Complexo de Édipo freudiano e minha hipótese:

O Complexo de Édipo é o conceito central para a psicanálise, pois alicerça a psicopatologia nele, na medida em que desempenha um papel primordial na constituição psíquica do ser humano e na orientação do seu desejo. Esse Complexo, para Freud, se refere às relações que a criança estabelece com as figuras parentais, das quais resultará a constituição de uma rede de representações inconscientes e de afetos. Ou ainda, é uma teia de sentimentos amorosos e/ou hostis, ou seja, sentimentos polarizados e angustiantes, que a criança vivencia em relação a seus pais.

Entretanto, me parece que Freud atribui muita responsabilidade aos infantes. E pior, uma responsabilidade sexual que nem cabe, tão cedo, na estrutura infantil. Claro que tudo isso é jogado no inconsciente e “voilà”, tudo está explicado.

Na teoria freudiana o Complexo de Édipo anda de mãos dadas com o Complexo de Castração, que refere-se à fantasia de castração que a criança elabora em uma tentativa de responder a questão da diferença anatômica entre os gêneros, ou seja, o masculino com pênis e o feminino sem pênis, criando uma angustiante necessidade nos infantes para entender isso.

E a explicação/teoria de Freud segue complicando a vida das crianças: para ele, no começo, a criança deseja ser tudo para a mãe; o desejo da criança é ser objeto do desejo do Outro (mãe); identifica-se com o que é objeto do desejo da mãe. Esta seria uma relação dual, na qual os dois personagens estão presos pela mesma ilusão de completude. Na sequência, aparece o pai como aquele que priva a criança de ser o objeto que completa a mãe. O pai intervém como aquele que priva a mãe do bebê, possibilitando desamarrá-lo da identificação de ser o objeto do desejo materno (a criança deixa de “ser o falo” da mãe para voltar-se para “ter o falo”). Apesar dessa resolução, a criança fica enlaçada nesse outro objeto (o pai), que tem aquilo que a mãe deseja (o falo); o pai também apresentaria a criança, a questão da lei, que passará a fazer parte da existência.

Enfim, a meu ver, a teorização de Freud atribui muita responsabilidade para os infantes e a responsabilização dos pais, pela criação dos filhos, é mínima.

E eis que apresento a minha hipótese, para tentar, no mínimo, dividir tamanha responsabilidade, qual seja, estruturar um psiquismo que definirá uma existência toda.

Como cada nascimento envolve diretamente três pessoas, me parece bastante lógico dividir em três aquela responsabilidade que o Freud colocou nas costas só dos infantes. Aliás, as vezes até me parece necessário colocar toda responsabilidade pela criança nos ombros dos pais, que sempre são dois, obviamente. Lamentavelmente, nos dias de hoje, parece que o Estado tem mais responsabilidade do que os pais, pelos filhos.

Mas, como o objeto de estudos da Psicologia é a subjetividade, ou seja, a estrutura psíquica de cada sujeito, vou permanecer na hipótese de dividir em três, aquela responsabilidade toda por uma nova vida. Então, prezados pais, lamento informá-los, mas atrás de um filho problemático há sempre um pai e uma mãe.

E mais, agora desvelo algo nunca visto, algo que contraponho ao Complexo de Édipo: atrás de um filho há uma mãe, um pai, mas também, há uma esposa e um marido, ou seja, será que a angústia fundante nos infantes não se situa nessa complexidade, qual seja, conciliar os significantes mãe e pai + os significantes esposa e marido. Nesse ínterim costumo dizer/pensar: os pais podem ser bons exemplos de pai e mãe, mas, ao mesmo tempo, péssimos exemplos de marido e esposa. E como isso se inscreve na psique das crianças? E a inscrição dos significantes marido e esposa não pode afetar a organização sexual, sobretudo na adolescência, quando os filhos/as entram na puberdade?

Qual a implicação na organização psíquica de uma criança, que enxerga o pai como um super-herói, batalhador, provedor, forte … mas, ao mesmo tempo, este mesmo homem, é agressivo com a sua esposa, ou seja, agride a mãe dela/criança? Ou, a mãe é uma mãe atenciosa e cuidadora, mas passa ignorando afetivamente o marido? Ou será que o significante marido-esposa, do pai e da mãe, simplesmente não é considerado pela criança, como se acreditou até agora? Como um filho é influenciado por essa complexa teia relacional e emocional?

Aliás, se a minha hipótese for válida, me parece que conviria dividir aquela responsabilidade toda em 5, e não apenas em 3, ou seja: a mãe + o pai + a esposa + o marido + a criança/o filho = estrutura psíquica do infante. Assim, de uma responsabilidade total, a criança passaria para apenas 20% de responsabilidade e os pais teriam que assumir 80% da responsabilidade. Acho que isso até deixaria o Freud em choque, afinal, ele não foi um marido e pai muuuuito dedicado. Isso também, tiraria o foco do Complexo de Édipo e do infante, transferindo-o em boa medida aos dois adultos que geraram esta nova vida, logo, os dois maiores e principais responsáveis.

Ainda, ao estudar o Caso Dora, um famoso caso tratado por Freud, fiquei intrigado com as contingências familiares e temporais, nas quais Dora estava envolta. Por exemplo, a mãe (mulher, feminina...) era frágil, ou em outros termos, “PASSIVA” frente a vida e frente a relação conjugal... e já o pai, o “ATIVO”, afinal, era um empresário bem-sucedido, que, com certeza era o mantenedor material da família e mantinha o controle das finanças ... e certamente, a Dora, saindo da infância e adentrando na adolescência, enxergava um pai poderoso e a mãe como uma coitada... fazendo com que ela – mulher/feminina - entrasse numa crise de identificação e por que não, de identidade, afinal, não queria ser fraca como a mãe, ao mesmo tempo, não podia deixar de ser mulher. Ou ainda, ao mesmo tempo em que idealizava o pai, como forte, poderoso, ativo inclusive sexualmente pois tinha até uma amante, não podia deixar de perceber que ele apenas “usava” as mulheres, aliás, mesmo ela/Dora era usada como moeda de troca com o casal K.

E mais, retomando o Complexo de Édipo, trago outro caso freudiano, ou melhor, a questão da sexualidade precoce de Hans “o interesse de Hans pelo próprio pipi e os dos outros, incluindo pessoas mais velhas e animais (Lacan, 1956/1957)”, a questão que eu investigaria seria ver de quem ele “herdou” isto, esta força que o impulsionava em tenra idade. Pelo que consta em relatos posteriores, o próprio Hans, já mais velho, teria revelado sua admiração pelo pai: “...ele sabia como desfrutar de um copo (ou mais) de vinho, e da companhia de mulheres bonita. Uma das minhas memórias infantis mais vívidas é a de vê-lo no estribo do trem lotado de gente, indo à partida de futebol de domingo”.

Isso posto, destaco que sempre me intrigou/intriga, o pouco interesse de Freud pela personalidade da mãe e do pai (de esposa e marido, também). Afinal, se somos a soma de 23 cromossomos da mãe + 23 cromossomos do pai, será que não podemos herdar traços psíquicos e/ou traços instintivos deles? Traços instintivos que podem levar diretamente a sexualidade e a sua estruturação na/a partir da infância.

Por fim, reforço a minha tese da angústia infantil: mãe e pai x esposa e marido, ou seja, os pais podem ser uma excelente referência enquanto mãe e pai, entretanto, ao mesmo tempo, podem ser uma desastrosa referência de casal, ou seja, de esposa e marido. Então, COMO UM FILHO ORGANIZA ISSO?

Então, caro pai, cara mãe, prezado marido e prezada esposa, até agora, Freud tinha livrado vocês da responsabilidade que é gerar uma nova vida, mas, agora, está desvelado que ter filhos é uma responsabilidade gigante e intransferível. E que vocês condicionam a estruturação psíquica dos filhos, não só como mãe e pai, mas também, como esposa e marido. E que a criança não é mais, exclusivamente responsável por seus Complexos.


Tercio Inacio W. J.



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