Ensaio: CRÍTICA DA “RAZÃO INCONSCIENTE”

 

Ensaio

CRÍTICA DA “RAZÃO INCONSCIENTE”

Considerando a minha “veia” kantiana - “calibrada” com a pesquisa de Mestrado sobre a temática da moral/da educação moral em Kant, mas, sempre também, com o outro olho na Crítica da Razão Pura - não pude deixar de notar uma veia kantiana em Freud. Além, é claro, de ver algumas referências diretas a Kant nos próprios escritos freudianos.

Kant, que viveu entre 1724 a 1804 e publicou, suas principais obras, em 1781 (Crítica da Razão Pura), em  1788 (Crítica da Razão Prática) e em 1790 (Crítica da Faculdade do Juízo), constituiu-se em um marco, ou melhor, construiu um novo/outro paradigma para a compreensão da “razão” e consequentemente, da vida humana, afinal, a razão kantiana não é só “teórica”, mas também, prática e estética.

No momento, cursando Psicologia, enveredar pelas teorias freudianas foi algo inevitável, felizmente. Freud, que viveu entre 1856 a 1939 e publicou suas maiores descobertas, como a questão do sonho (1900), a sexualidade (1905), o inconsciente (perpassa toda a teoria dele) e o método/a técnica da psicanálise (desde o começo, em substituição da hipnose), não deixou de beber na fonte kantiana. Aliás, tanto bebeu que acabou ampliando, do meu ponto de vista, o paradigma da compreensão da razão humana, ou seja, a partir de Freud torna-se possível afirmar que temos uma razão “teórica”, prática, estética e inconsciente. Eis uma tese para entabular, ou, ao menos, tentar.

Isto apontado e considerando a minha veia kantiana - crítica - não demorei a cogitar uma “crítica da razão inconsciente”. Evidente que este escrito não passa de um ensaio primeiro, uma modesta provocação inicial a respeito de temas tão complexos, profundos e extensos.

O que me levou a esta “tese”, como sendo o passo inicial, foi a frustração em relação ao curso de Psicologia, ou melhor, optei pela Psicologia por estar debruçado, naquele e neste momento da minha vida, sobre a temática dos nossos sentimentos, da afetividade que nos move, das emoções que nos elevam mas, também, nos afundam. Enfim, como um alemão teimoso e bastante racional, que vivenciou uma depressão, fui levado a dar mais atenção a minha condição emocional, afinal, esta colocou em xeque a outra, qual seja, a racional. Assim, desafiado, felizmente consegui optar pela busca de ajuda, de leituras... passando a incluir a condição afetiva, efetivamente, em minha vida, tanto que, resolvi-me pela graduação em Psicologia, no intuito de seguir me aprofundando sobre. Entretanto, para minha surpresa, pouco se fala – se falou até o momento - em sentimentos, emoções e afetividade no curso, que para mim, deveria ser o objeto de estudo da Psicologia, ou seja, estudar a condição subjetiva-emocional do ser humano.

Comportamento, percepção, personalidade, genética, consciência, personalidade, desenvolvimento, interação social, inconsciência, educação, mente, técnicas, etc, são as temáticas, comumente tratadas durante as aulas, entretanto, disciplina após disciplina, raramente a questão afetiva/emocional é abordada de forma direta e exclusiva.  

Em relação a teoria de Freud - já tratada em várias disciplinas específicas, e de forma majestosa pelos professores, além das leituras pessoais feitas e em andamento – a situação não é muito diferente. Grandes temas, profundas e elaboradas teorias, paradigmas superados, novos paradigmas construídos, enfim, basta dizer que a obra freudiana contém 24 volumes, nos quais, muito pouco se trata, direta e explicitamente, da condição afetiva.

Disto tudo, claro que exposto aqui de forma breve, resulta a minha hipótese: Freud, influenciado pela teoria kantiana e pelo paradigma “moderno” da razão, também fundou a partir deste, ou melhor, da razão, a sua teoria do inconsciente, afinal, bewusst e unbewusst (traduzível por: saber e não saber) são conceitos que só fazem sentido em relação à razão.

 

 

 

1. Razão “simbólica”: representar; juízos de fato (causa-efeito: certo-errado/verdadeiro-falso);           eu-objeto

2. Razão prática:          sentir;         juízos de valor (meio-fim: bom-mau);                                             eu-outros

3. Razão estética :       apreciar;       juízos de gosto (agradável-desagradável);                                       eu-outro objeto

4. Razão inconsciente:desejar;        juízos de autopreservação (sobreviva-reproduza: vida-morte);       eu-não eu


   Tércio Inácio

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